O Instituto Pro Bono se une a centenas de organizações da sociedade civil na campanha nacional “ONG pela democracia”. O IPB, que há 20 anos atua com atendimento jurídico a entidades, compreende que, mais do que nunca, é necessário fortalecer juridicamente a sociedade civil. Leia abaixo o manifesto endossado pelas entidades.
SEM SOCIEDADE CIVIL ORGANIZADA E FORTALECIDA, NÃO HÁ DEMOCRACIA!
Assegurar a existência de um espaço cívico seguro é responsabilidade do Estado de Direito
As organizações da sociedade civil, ONGs, coletivos, movimentos sociais, institutos e fundações, sem fins lucrativos, democráticas, pluralistas, antirracistas, anti-lgbtfóbicas, antissexistas, assim como seus trabalhadores e trabalhadoras, que lutam contra todas as formas de discriminação, de desigualdades, pela construção de modos sustentáveis de vida e pela radicalização da democracia, que defendem os direitos humanos, os bens comuns e uma sociedade civil viva, vem a público trazer seu posicionamento diante do duro cenário que enfrentamos no Brasil, compreendendo que é necessário ter nitidez na leitura da realidade e pragmatismo para interpretar nossa conjuntura em 2022: não vivemos tempos normais!
Desde a redemocratização do país, em 1985, diversos setores da sociedade vêm trabalhando arduamente para estabelecer e consolidar a democracia e isso só foi possível – parcialmente – graças ao compromisso da sociedade civil organizada. Contudo, os avanços sociais e econômicos e o fortalecimento da democracia que alcançamos têm sido atacados e destruídos por meio de uma agenda ultraneoliberal, conservadora e fundamentalista, imposta desde o golpe de 2016 que depôs a presidenta Dilma Rousseff.
Em 2018, Jair Bolsonaro foi eleito com um programa de aprofundamento dessa mesma agenda neoliberal, com diminuição dos investimentos públicos na área social, desindustrialização, desvalorização de nossa moeda, privatizações de setores estratégicos etc., agenda política esta que somos radicalmente contra. Nós defendemos a atuação do Estado como um agente de transformação social por meio de investimentos públicos e aberto à participação das organizações da sociedade civil (OSCs) na construção de uma sociedade mais justa e igualitária, no combate à fome e às desigualdades, atuação essencial sobretudo diante dos graves efeitos da pandemia e da crise econômica. Ao contrário disso, temos um Governo Federal que potencializa esses efeitos com uma gestão irresponsável e genocida.
Para além das posições políticas antagônicas citadas acima, existe ainda uma divergência a mais, esta que faz o atual governo ultrapassar a fronteira da civilidade e impossibilita qualquer tipo de diálogo: os ataques sistemáticos à democracia, a suas instituições e processos que a envolvem. Desde o início de seu governo, ações foram tomadas para eliminar a participação popular e o controle social das políticas públicas, com dramática redução dos níveis de transparência e fechamento dos espaços cívicos e participativos (tais como conselhos e conferências). Logo em seguida ao ato de sua posse, Bolsonaro discursou atacando as OSCs/ONGs e, durante seus quase quatro anos de governo, continuou não só com ataques sistemáticos como também utilizando-se de estratégias burocráticas para criminalizar as organizações, como pode ser visto no documento elaborado pela Abong intitulado “Relatório de criminalização das OSCs no governo Bolsonaro”. São também aproximadamente quatro anos de violências contra as mulheres, as/os negras/os, a população LGBTQIA+, os povos indígenas, quilombolas, originários e ribeirinhos etc.
A partir do momento que vivemos, é necessário que nos posicionemos radicalmente em favor da candidatura que pode derrotar Bolsonaro nas urnas, bem como todos os retrocessos e ideais antidemocráticos que ele representa. Assim, acreditamos que a única plataforma capaz de impor essa derrota é o movimento de frente ampla que vem sendo construído coletivamente em torno da candidatura do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e Geraldo Alckmin.
Não obstante, tornamos públicas também nossas considerações e agendas políticas ao candidato, solicitando o compromisso do seu plano de governo em:
- Defender a democracia e as instituições dela derivadas, opondo-se a posturas autocráticas, arbitrárias, conservadoras e fundamentalistas no nível nacional e estadual; garantir a transparência, a participação e a distribuição democrática do orçamento público da União e do Estado; criar e fortalecer conselhos de direitos e demais espaços de participação popular; criar um conselho junto à sociedade civil para contribuir para a restauração da paz e da democracia, visando a responsabilização dos agentes públicos que desestabilizaram a democracia e os direitos humanos e também a diminuição das violências políticas;
- Estabelecer e/ou fortalecer a existência das OSCs como parte da democracia, fomentando uma ambiência social e institucional permeável à crítica e à participação da sociedade nas definições sobre suas vidas, bem como interlocução sistemática com as OSCs, com vista à colaboração mútua entre o governo e as OSCs; atuar no enfrentamento à criminalização e subfinanciamento vivido pelas OSCs que defendem direitos e bens comuns ao lONGo dos anos, construindo e fortalecendo ações com foco na sustentabilidade política e financeira das OSCs; criar um fundo público para as OSCs que atuam na defesa de direitos e democracia; elaborar e incentivar editais públicos destinados às OSCs, contribuindo para que se assegure a impessoalidade, transparência e credibilidade do processo, como estratégia de democratização dos fundos públicos; avançar na implementação e efetividade do Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (MROSC) em todos os níveis federativos;
- Priorizar programas e ações de combate à fome e à miséria; fortalecer as políticas e conselhos voltados a essa temática, como o Conselho de Segurança Alimentar (Consea), Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE); fortalecer e incentivar a agricultura familiar e a agroecologia, favorecendo alimentos sem veneno; assumir o compromisso de realização da reforma agrária;
- Atuar na defesa intransigente dos direitos humanos, no enfrentamento ao racismo, ao sexismo, à xenofobia e ao capacitismo, se posicionando pela consolidação dos direitos de populações em maior vulnerabilidade e risco social, como as pessoas LGBTQIA+, pessoas negras, indígenas, população em situação de rua, mulheres, pessoas em situação de cárcere, população rural, juventudes, PCDs, imigrantes e refugiados ; construir projetos de lei e fiscalizar o poder público na implementação de políticas de ampliação desses direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais (DHESCA) e combate às violações;
- Assumir o compromisso com a luta em defesa da vida de defensoras/es dos direitos humanos, buscando mecanismos legais para proteção e preservação de suas vidas no exercício do seu trabalho e militância em seus territórios;
- Fortalecer um Estado efetivamente laico, com ações concretas de combate ao racismo religioso e criação de mecanismos institucionais de prevenção e controle para evitar o desvirtuamento das funções públicas por razões de convicção religiosa das autoridades públicas;
- Assumir o compromisso com a revogação da Emenda Constitucional 95, que congela os gastos públicos e compromete a garantia dos direitos humanos econômicos, sociais, culturais e ambientais;Assumir o compromisso com a revogação da Reforma Trabalhista, que aumentou a precarização do trabalho jogando grande parte da classe trabalhadora para a informalidade, além de aumentar a carga e a jornada de trabalho, desmantelando os avanços sociais históricos firmados na CLT;
- Assumir o compromisso com a preservação da Amazônia e dos demais biomas brasileiros, bem como trabalhar de forma favorável aos povos indígenas, quilombolas, originários, populações ribeirinhas etc., contra o Marco Temporal e pela demarcação e proteção de terras indígenas e quilombolas;
- Atuar na defesa, manutenção e ampliação das políticas de cotas raciais e sociais nas universidades e no mercado de trabalho, sobretudo no que diz respeito a editais e a concursos públicos;
- Criar políticas públicas antiproibicionistas e de descriminalização do uso de drogas, atreladas à elaboração participativa de políticas que compreendam a segurança pública como parte dos direitos humanos; acabar com a política de guerra às drogas, responsável pelo encarceramento em massa da população negra, pobre e periférica; criar políticas de redução de danos; criar um pacto junto aos estados pelo compromisso de erradicação da violência policial, sobretudo nos territórios mais vulnerabilizados;
- Estabelecer um quadro de paridade racial e de gênero no corpo técnico dos ministérios e inclusão de outros públicos sub-representados como LGBTQIA+, pessoas com deficiência etc.
- Retomar os trabalhos da Rede de Monitoramento Amiga da Criança articulada pelo governo Lula em seus dois mandatos anteriores ( 2003 à 2010 ), em que todos os Ministérios dialogavam com aproximadamente trinta organizações da sociedade civil em conformidade com o plano Presidente Amigo da Criança e Adolescente, obtendo graças a essa parceria avanços relevantes – alguns dos quais reconhecidos internacionalmente – em todos os campos prioritários do compromisso firmado com as crianças, adolescentes e a sociedade brasileira.
- No mais, este movimento intitulado “ONGs pela democracia” afirma que seguirá cumprindo seu papel na defesa da democracia e no monitoramento das ações do Estado, para que esse atue efetivamente na ampliação de políticas sociais e ambientais e pela promoção de uma sociedade mais justa e igualitária, com vida digna para todas as pessoas.
Brasil, 20 de outubro de 2022
Assinam essa nota as seguintes ONGs, OSCs, coletivos, movimentos sociais, institutos e fundações:
- ABGLT
- Abong – Associação Brasileira De ONGs;
- Ação Educativa – Assessoria, Pesquisa e Informação
- Acari – Associação Civil de Articulação para a Cidadania
- Acesso – Cidadania e Direitos Humanos
- ACIRGS – Associação Ciganos Itinerantes do RGSADDH
- Aecfarcida
- Aliança Pela Alimentação Adequada e Saudável
- AMTMO – Associação das Mulheres Trabalhadora do Município de Oriximiná
- Aprosmig
- Articulação para o Monitoramento dos Direitos Humanos no Brasil
- Associação Cultural Nascente Pequena
- Associação Defensores da Terra
- Associação Cidade Escola Aprendiz
- Antra – Associação Nacional de Travestis e Transexuais
- Associação Tamo Juntas – Assessoria Multidisciplinar Gratuita para Mulheres em Situação de Violência
- Associação de Mulheres Trabalhadoras do Município de Óbidos
- Associação de Moradores do Conjunto Santa Luzia
- Avante – Educação e Mobilização Social
- Brasil Saúde e Ação – BRASA
- CAMTRA
- Capina – Cooperação e Apoio à Projetos de Inspiração Alternativa
- Casa das Mulheres do Nordeste
- Católicas pelo Direito de Decidir
- CAMP – Escola de Cidadania
- CDHEP – Centro de Direitos Humanos e Educação Popular de Campo Limpo
- CECA – Centro Ecumênico de Capacitação e Assessoria
- Cecup – Centro de Educação e Cultura Popular
- CEDAPS- Centro de Promoção da Saúde
- CENARAB
- Cenpec
- Centro das Mulheres do Cabo
- Centro de Defesa da Vida Herbert de Souza
- Centro de Defesa dos Direitos Humanos Antônio Conselheiro
- Centro de Defesa dos Direitos Humanos de Petrópolis
- Centro de Direitos Humanos de Palmas
- Centro de Direitos Humanos Dom Máximo Biennès
- Centro de Integração Raio de Sol
- Centro Dom Helder Camara de Estudos e Ação Social
- Centro dos Direitos Humanos de Joinville
- Centros de Direitos Humanos de Palmas
- Centro de Direitos Humanos da Baixada Santista Irmã Maria Dolores
- CESE – Coordenadoria Ecumênica de Serviço
- Cetra – Centro de Estudos do Trabalho e de Assessoria ao Trabalhador e à Trabalhadora
- Cipó – Comunicação Interativa
- Circo de Todo Mundo
- Coletivo 660
- Coletivo Clã Das Lobas
- Coletivo Feminino Plural
- Coletivo Iya Akobiobe
- Coletivo pela Democracia
- CDHPF – Comissão de Direitos Humanos de Passo Fundo
- Comitê dos Povos e Comunidades Tradicionais do Pampa
- CRJPMS
- Ecos – Comunicação Em Sexualidade
- Elo Ligação E Organização
- Escola Comunitária Luiza Mahin
- Escola de Formação Quilombo dos Palmares
- Escola Livre de Redução de Danos
- Fórum das Ong/Aids do Estado de São Paulo
- Fórum Grita Baixada
- GTP+ – Grupo de Trabalhos Em Prevenção Posithivo
- Grupo Solidariedade do Estado de Minas Gerais
- Ibase – Instituto Brasileiro de Análises Sociais E Econômicas
- IDDH – Instituto de Defensores de Direitos Humanos
- Instituto de Referência Negra Peregum
- Instituto Envolverde
- Instituto Kairós – Ética e Atuação Responsável
- Instituto Paul Singer
- Instituto Pro Bono
- Instituto Rosa dos Ventos
- Instituto Silvia Lane
- Instituto Soma Brasil
- Instituto Vladimir Herzog
- Irohin Centro de Documentação, Comunicação e Memória Afro Brasileira
- Koinonia
- LBL – Liga Brasileira de Lésbicas
- MMCC / PA
- Moitará Sociedade Civil
- Movimento Acredito
- Movimento Bem Viver / SC
- Movimento Estadual de Direitos Humanos
- MNDH Brasil – Movimento Nacional de Direitos Humanos
- MUDA – Movimento Urbano de Agroecologia
- Mudiá – Coletiva de Visibilidade Lésbica
- ONG Contato
- PapodeperiferiaOfc
- Pólis – Instituto de Estudos, Formação e Assessoria em Políticas Sociais
- Profec – Centro Ecumênico de Formação e Educação Comunitária
- Projeto Ammor
- Quintal Educativo
- RBDC – Rede Brasileira de Conselhos
- Rede de Notícias da Amazônia
- Redeh – Rede de Desenvolvimento Humano
- RNP +
- Rufflesmax Produção Cultural
- SEFRAS – Ação Social Franciscana
- Serpaz – Serviço de Paz
- Sitiom
- SOMADENA / MA
- Sushimar Laranjeiras
- Uneafro Brasil
- Vida Brasil