⠀⠀⠀⠀⠀⠀Introdução
Fundado em 2001, o Instituto Pro Bono (“Instituto”) conecta organizações da sociedade civil que não possuam recursos para arcar com a contratação de serviços jurídicos e pessoas físicas em situação de vulnerabilidade socioeconômica a advogadas e advogados dispostos a oferecer assessoria jurídica pro bono, com o objetivo de contribuir com o enfrentamento à desigualdade no acesso à Justiça.
A advocacia pro bono é fundada em sete elementos: (i) trabalho jurídico, (ii) prestado por advogados, (iii) em caráter gratuito, (iv) voluntário, (v) institucionalizado, (vi) a pessoas com poucos recursos socioeconômicos, (vii) podendo servir ao interesse público.1 Como atividade permanente, formalizada e coletiva, a advocacia pro bono constitui parte da rotina de advogadas e advogados autônomos e também da atuação jurídica de escritórios de advocacia e empresas.
O trabalho pro bono envolve a relação de duas figuras: aquela que detém saber e técnica jurídica e aquela em situação de desvantagem socioeconômica, cujo acesso a conhecimentos e ritos para acessar o sistema jurídico e garantir seus direitos é limitado. Há, portanto, uma relação assimétrica, que deve ser objeto de cuidado e atenção.
Nesse cenário, a presente Política de Integridade (“Política”) reafirma o compromisso organizacional do Instituto em (i) garantir que os beneficiários da advocacia pro bono sejam tratados com respeito e linguagem adequada; e (ii) vedar qualquer comportamento abusivo ou degradante nos projetos conduzidos pelo Instituto.
⠀⠀⠀⠀⠀⠀1. Objetivo
Esta Política tem como objetivo reger o contato a advogados com pessoas hipossuficientes em atividades, atendimentos e encontros promovidos pelo Instituto, de modo a garantir que suas práticas institucionais sejam sempre desenvolvidas de maneira a promover a proteção e a garantia de direitos.
⠀⠀⠀⠀⠀⠀2. Referência normativa
A presente Política encontra fundamento em tratados internacionais de direitos humanos2, nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável previstos pela Agenda 2030 das Nações Unidas
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¹MALDONADO, Daniel B. Los mandarines del derecho. Bogotá: Siglo del Hombre Editores, 2017.
² O direito de acesso à justiça e o direito ao devido processo são salvaguardados por instrumentos como a Declaração Universal de Direitos Humanos, que traz em seu artigo 8° que “toda a pessoa tem direito a recurso efetivo para as jurisdições nacionais competentes contra os atos que violem os direitos fundamentais reconhecidos pela Constituição ou pela lei”, e no artigo 10 que ”toda a pessoa tem direito, em plena igualdade, a que a sua causa seja equitativa e
(“ODS”)³, e nos direitos garantidos pela Constituição Federal da República Federativa do Brasil de 1988, sobretudo os especificamente referentes ao acesso à Justiça.
No Brasil, a advocacia pro bono para pessoas físicas foi formalmente reconhecida pelo Novo Código de Ética e Disciplina (“Código de Ética”) da Ordem dos Advogados do Brasil (“OAB”), em vigor desde setembro de 2016. Nos termos do artigo ³0, a advocacia pro bono é considerada “a prestação gratuita, eventual e voluntária de serviços jurídicos em favor de instituições sociais sem fins econômicos e aos seus assistidos, sempre que os beneficiários não dispuserem de recursos para a contratação de profissional”.
O Provimento nº 166/2015 do Conselho Federal da OAB, que regulamenta o exercício da advocacia pro bono com base na previsão do Código de Ética, dispõe que advogados e integrantes de sociedades de advogados e de departamentos jurídicos de empresas que desempenharem a advocacia pro bono ficam impedidos, por três anos, de prestar serviços jurídicos remunerados a quem tenha se beneficiado de serviços pro bono.
⠀⠀⠀⠀⠀⠀3. Termos
Pessoas hipossuficientes em situação de vulnerabilidade: pessoas de escassos recursos econômicos que podem, ainda, acumular outros marcadores sociais devido à discriminação por raça, cor, cultura, idade, deficiência, orientação sexual e identidade de gênero.
Contato direto: todo atendimento pro bono realizado de forma presencial.
⠀⠀⠀⠀⠀⠀4. Abrangência
Esta Política deverá ser observada por todos os empregados, estagiários, contratados, consultores, colaboradores e voluntários do Instituto que se envolverem direta ou indiretamente com o atendimento a pessoas hipossuficientes em situação de vulnerabilidade socioeconômica.
⠀⠀⠀⠀⠀⠀5. Normas de conduta
5.1. Tratar todas as pessoas hipossuficientes em situação de vulnerabilidade com dignidade e respeito, sem discriminação ou preconceito com relação à raça, cor, cultura, idade, deficiência, orientação sexual e identidade de gênero;
5.2. Evitar trabalhar sozinho, desenvolvendo os atendimentos pro bono e o contato direto, sempre que possível, em duplas ou em equipe;
publicamente julgada por um tribunal independente e imparcial”. O Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, de 1966, e a Convenção Sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra a Mulher, de 1979, também trazem reflexões nesta linha.
³O ODS nº 16, por exemplo, tem como objetivo “promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis”.
5.3. Nunca se utilizar de agressões físicas ou verbais, mesmo se a pessoa hipossuficiente em situação de vulnerabilidade se comportar de forma inadequada; e
5.4. Assegurar o consentimento por escrito da pessoa hipossuficiente em situação de vulnerabilidade antes de gravar sua voz ou imagem.
⠀⠀⠀⠀⠀⠀6. Medidas de implementação
6.1. Institucional: Criação de Comitê de Integridade (“Comitê”), composto pela Presidência do Conselho Deliberativo, Diretoria Executiva e Coordenação Executiva de Projetos do Instituto, responsável pelo acompanhamento das atividades de implementação, monitoramento e revisão periódica desta Política; nomeação da Diretoria Executiva Adjunta como Coordenadora de Integridade.
6.2. Recursos Humanos: Compromisso da equipe atual do Instituto com a Política, responsabilizando-se perante a Diretoria Executiva e o Conselho Deliberativo e, especialmente pelo Comitê.
6.3. Novos projetos: Mapeamento de situações de risco de dano a pessoas hipossuficientes em situações de vulnerabilidade antes do início de projetos que envolvam atividades presenciais; esclarecimento ao Comitê dos motivos do risco (causa), chance de se configurar (probabilidade) e as consequências (impacto).
6.4. Clearinghouse: O atendimento a organizações da sociedade civil que trabalhem com pessoas hipossuficientes em situações de vulnerabilidade estará condicionado à verificação de due diligence antes do encaminhamento de cada caso em potencial.
Os recursos humanos e financeiros necessários para apoiar a implementação desta Política serão disponibilizados anualmente.
⠀⠀⠀⠀⠀⠀7. Prevenção
O processo de recrutamento de empregados, estagiários, contratados, consultores, colaboradores e voluntários levará em consideração referências quanto ao potencial comprometimento com os padrões de proteção desta Política.
⠀⠀⠀⠀⠀⠀8. Denúncias
8.1. Indagações e denúncias de violação a esta Política devem ser enviadas por e-mail ao endereço protecao@probono.org.br e com o maior detalhamento possível sobre os fatos, o local, a data e as pessoas envolvidas.
8.2. O procedimento de apuração da denúncia será feito pelo Comitê, que se compromete a preservar a confidencialidade e tomar todas as medidas cabíveis a fim de evitar qualquer tipo de retaliação a quem realizá-la.
8.3. Em caso de materialidade da denúncia serão ser aplicadas as seguintes medidas, de acordo com a gravidade da ocorrência: (i) advertência escrita; (ii) suspensão; e (iii) demissão ou rescisão contratual para afastamento.
⠀⠀⠀⠀⠀⠀9. Divulgação, Monitoramento e Avaliação
O Comitê revisará esta Política a cada dois anos, sem prejuízo de ser alterada mediante provocação do Conselho Deliberativo.
Serão apresentados relatórios semestrais com informações acerca do grau de implementação desta Política e principais desafios e obstáculos enfrentados, bem como menções sobre eventuais violações e resultados subsequentes, para fins de monitoramento e aperfeiçoamento.
⠀⠀⠀⠀⠀⠀10. Vigência
Esta política entra em vigor a partir de 01 de outubro de 2020.